Menos de um ano para as eleições: o que vem em 2026?
Humberto Dantas
Daqui um ano, em condições normais de democracia, conheceremos os políticos eleitos em 2026. Tratam-se dos executivos estaduais e federal, da Câmara dos Deputados, de dois terços do Senado e das Assembleias Legislativas, incluindo o parlamento do DF. Um levantamento feito na primeira semana de novembro por estudantes da pós-graduação em Ciência Política da FESP-SP, como atividade da disciplina de Análise Política, mostra que temos pesquisas de intenção de voto em todos os estados, concluídas entre setembro e novembro de 2025. São dados relativamente novos, gerados principalmente por Real Time e Paraná Pesquisas que assinam 24 dos 27 estudos mais recentes localizados.
Ao todo, 16 governadores não podem ser reeleitos, e dos onze que podem, seis lideram o principal cenário. Roraima e Tocantins têm governadores enfrentando problemas na justiça. O primeiro não pode se reeleger e se mostra instável no cargo e o segundo foi afastado temporariamente para se defender de acusações, com o vice em seu lugar.
A oposição lidera 12 estados, e candidaturas apoiadas pelos atuais governadores estão na ponta em outros três. Somados os 12 oposicionistas, os seis governadores que lideram e os três ponteiros apoiados por governadores, temos 20 estados. Nas demais unidades, as figuras que lideram parecem fazer oposição, mas também disputam o apoio do governador ou de parte de seu grupo governista, sendo possível falar em incertezas.
Partidariamente, o PSDB perdeu os três governadores eleitos em 2022, que mudaram para o PSD (2) e para o PP. Atualmente, o PSD é a legenda que mais governa estados: são cinco, com PT e União Brasil no comando de quatro unidades cada. O PL tem dois governadores.
Ideologicamente, seguindo classificação da Ciência Política, a direita governa 17 estados, principalmente com PSD, PL, PP e Republicanos; a esquerda tem sete, com PT e PSB; e o centro três, todos com o MDB. A tendência se repete nas pesquisas: a direita lidera a maioria dos estados.
Apenas quatro líderes, faltando um ano para a eleição, têm 50% ou mais das intenções de voto, com destaque aqui para Amapá, Piauí, Pernambuco e Rio de Janeiro. Nominalmente, exceção feita ao Amazonas, todos os líderes e vice-líderes nas pesquisas são políticos com ou sem mandatos, ou seja, a onda de novidades de fora do sistema não parece ter força nesse instante. No Maranhão, um secretário, familiar do governador, aparece como competitivo.
Regionalmente, a direita lidera o Sul, com o PL em dois estados (SC/RS) e o União Brasil no Paraná. No Sudeste, o Republicanos aparece na ponta em SP, MG e ES, com o Rio de Janeiro nas mãos do PSD e a direita absoluta. No Centro-Oeste, a direita lidera três estados, e em Goiás o MDB, de centro, é que ponteia. No Norte, a direita também predomina, e o MDB lidera no Amapá e em Roraima. Por fim, no Nordeste, aparece líderes à esquerda em três estados (CE, PI e PE).
Dois vice-governadores lideram cenários pesquisados, em Goiás e no Distrito Federal – este segundo com uma mulher. No quesito gênero, apenas em Roraima, Tocantins e, como dito, no Distrito Federal, a liderança é de uma mulher. Salienta-se aqui que em outro trio de estados, Pernambuco, Piauí e Rio Grande do Sul, mulheres estão em segundo lugar.
Dos 27 estados brasileiros, em apenas 17 deles o terceiro colocado tem 10 ou mais pontos percentuais nas intenções de voto. Diante de tais aspectos, faltando menos de um ano para as eleições, as tendências verificadas em 2022 seguem fortes: polarização entre dois grupos, direita no poder subnacional, baixa representatividade feminina e alinhamentos entre partidos que não necessariamente respeitam questões de ordem nacional.
Da Rio-92 à COP30: seguimos tentando combater a crise climática
Anuska Soares
A COP30 foi realizada entre 10 e 22 de novembro de 2025 em Belém (PA), marcando o retorno do Brasil ao centro das negociações climáticas. Trinta e três anos após a Eco-92, o evento celebrou os dez anos do Acordo de Paris e destacou a Amazônia como peça-chave para o equilíbrio climático global. A Fundação Konrad Adenauer participou ativamente, organizando o painel “Mitigação e Adaptação Climática: Boas práticas subnacionais em perspectiva”, no Pavilhão Brasil, junto com seu parceiro ICLEI e com secretários de meio ambiente de diversas capitais brasileiras (CB27).
Geopolítica e ausências
A COP30 deslocou o eixo das negociações para o Sul Global, reforçando demandas de financiamento climático e dando voz a comunidades amazônicas e indígenas. Os estudos científicos reafirmam que o Sul Global é o que menos contribuiu para a crise climática, mas o que mais sofre seus impactos. A ausência dos Estados Unidos reduziu a pressão diplomática e fragmentou a liderança global, permitindo maior protagonismo da União Europeia e da China, mas com ritmo mais lento nas negociações.
Resultados principais
O encontro terminou com o consenso de 195 países e a aprovação do “Pacote de Belém”, composto por 29 decisões, além do aumento de NDCs, de 94 para 122. Entre os avanços estão:
- Mecanismo de Transição Justa (BAM): estrutura permanente para apoiar países em desenvolvimento na transição para economias de baixo carbono.
- Financiamento para adaptação: compromisso de triplicar recursos até 2035, alcançando US$ 1,3 trilhão anuais, embora sem detalhamento imediato.
- Meta Global de Adaptação: adoção de 59 indicadores voluntários para monitorar setores como água, saúde e infraestrutura.
- Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF): arrecadação inicial de US$ 6,7 bilhões, com meta de captar US$ 125 bilhões do setor privado e pagar países pela preservação de florestas.
- Decisão “Mutirão”: incentivo à implementação prática dos acordos, com iniciativas como a Global Implementation Accelerator.
Marcos políticos inéditos incluíram o reconhecimento dos direitos indígenas como parte essencial da estratégia climática, a abertura da discussão sobre comércio internacional e a aprovação do Plano de Ação de Gênero de Belém. Contudo, o “Mapa do Caminho” para eliminar combustíveis fósseis e zerar o desmatamento foi barrado por países produtores de petróleo, ficando para futuras negociações.
Alertas científicos
A comunidade científica enfatizou a urgência de ações imediatas, alertando que o limite de 1,5°C será ultrapassado, com novo patamar de 1,7°C. Essa que era para ser a COP da implementação pecou por não transformar os dianósticos da ciênca em políticas a serem seguidas
Conclusão e próximos passos
Com mais de 56 mil pessoas inscritas e 42 mil participantes de 195 países na Blue Zone , a COP30 reforçou o protagonismo brasileiro e colocou a Amazônia no centro do debate global. O evento trouxe benefícios econômicos locais, como aumento do turismo e empregos temporários, além de potencial para atrair investimentos em energia limpa. Fora das negociações formais, houve mobilização social histórica: a Cúpula dos Povos reuniu 25 mil pessoas e a Marcha Global pelo Clima levou 70 mil às ruas.
Problemas estruturais marcaram o evento, como falhas de segurança, refrigeração e saneamento, além de um incêndio que interrompeu os trabalhos. Avaliações pós-COP indicaram avanços pontuais, mas insuficientes diante da urgência climática. O Brasil foi reconhecido por seu papel articulador, embora sua imagem tenha sido afetada por contradições internas, como a intenção da Petrobras de explorar petróleo na Margem Equatorial. A União Europeia criticou a falta de metas claras para eliminação dos fósseis, mas manteve a pressão sobre a transição energética.
O Brasil continuará presidindo a COP até 2026, elaborando o “Mapa do Caminho” para reduzir combustíveis fósseis com apoio de mais de 80 países. O embaixador André Corrêa do Lago destacou que o multilateralismo “está vivo” e ainda capaz de gerar resultados. A COP31 será realizada na Turquia, sob presidência da Austrália, com consultas previstas para resolver divergências entre os dois países.
PEC da Segurança Pública e o controle do crime organizado no Brasil
Daniel Edler
Em abril de 2025, o ministro da justiça e segurança pública, Ricardo Lewandowski, apresentou ao Congresso Nacional a Proposta de Emenda à Constituição nº 18, ou “PEC da Segurança Pública”. A proposta se inspira em outros mecanismos legais que visam a integrar serviços básicos ofertados à população, como saúde e educação, atribuindo à União papel de coordenação de políticas de segurança em âmbito nacional. Desde 2018, o governo federal se apoia no Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) para estabelecer normais gerais nesse campo, mas com poucos efeitos práticos no que tange à integração institucional e eficácia no controle da criminalidade.
As forças policiais brasileiras formam um arquipélago institucional em que diferentes atores competem mais do que cooperam. O resultado é a falta de processos básicos, como padronização e integração dos registros de ocorrência, o que prejudica análises estatísticas e de inteligência sobre a atuação do crime organizado no país. Na prática, sem integração, a força policial de um estado tem dificuldade de acesso a inquéritos abertos e mandados de prisão expedidos em outro, o que incentiva a mobilidade de suspeitos e alimenta a sensação de impunidade. Criado há mais de 10 anos para cobrir essa lacuna, o sistema de Procedimentos Policiais Eletrônicos ainda sofre com a falta de adesão.
Esse arquipélago se repete em âmbito operacional, embora alguns arranjos tenham sido criados para superar o problema. As Forças Integradas de Combate ao Crime Organizado (FICCO), por exemplo, têm tido êxito ao trazer mais capilaridade às investigações, viabilizando o diálogo entre forças policiais, mas também com órgãos especializados. A cooperação a nível nacional resultou recentemente na operação “Carbono Oculto” que apurou e reprimiu esquemas de lavagem de dinheiro do PCC no setor de combustíveis e no sistema financeiro. O sucesso da operação demandou o diálogo das forças policiais de São Paulo com a PF, o MPF e outras instituições federais, incluindo o COAF e a Receita. Porém, mesmo os exemplos positivos têm sido incapazes gerar arranjos operacionais mais duradouros, o que leva alguns especialistas a proporem a criação de uma autoridade nacional antimáfia com autonomia administrativa e orçamentária.
Frente a esses desafios, a PEC representa avanços incrementais, basicamente constitucionalizando os SUSP. O texto reconhece atribuições das guardas municipais, consolida mecanismos de controle e participação, como as ouvidorias, corregedorias e conselhos consultivos, além de fortalecer o Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP) e o Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN), usados pela União para apoiar iniciativas locais e promover políticas mais coordenadas. No que tange ao combate ao crime organizado, a PEC atribui à PF protagonismo na investigação e repressão a crimes de repercussão interestadual e internacional. Trata-se de um passo tímido e com riscos – como o exacerbado corporativismo das polícias, que pouco contribui para sua profissionalização –, porém na direção certa da integração de informações, recursos e planejamento.
Contudo, os resultados chocantes da operação de 28 de outubro no Rio de Janeiro atropelaram os debates no congresso, antecipando as disputas eleitorais de 2026. Se já existiam dúvidas sobre a aprovação da PEC, principalmente por críticas de governadores por uma suposta perda de autonomia, o que se vê agora é que a iniciativa do governo foi atravessada pela CPI do Crime Organizado e pelo avanço de propostas de recrudescimento punitivo que em nada contribuem para a construção de um arcabouço institucional capaz de trazer agilidade e eficiência para o controle da criminalidade. Aumentar penas é demagogia na ausência de mecanismos robustos de investigação. Sem bons inquéritos policiais e denúncias sustentadas por evidências robustas, veremos a reprodução da impunidade nos tribunais, principalmente para o andar de cima do crime organizado. Ao invés de debatermos sobre a racionalidade da estrutura de segurança pública, voltamos a propostas que servem apenas para aumentar o tamanho do pano que usamos para enxugar o gelo, ou nem isso.